quarta-feira, 23 de julho de 2014

24: O pior dia da vida. Vezes 10.

O mundo da espionagem e seus agentes é sempre um prato cheio para os escritores e para os amantes de uma boa história permeada por intrigas internacionais, correria sem fim, lutas corporais e psicológicas e, porque não, um pouco de romance. É fato comprovado que toda vez que alguém lhe perguntar qual é o mais famoso agente secreto da ficção, sua resposta, automaticamente, será Bond, James Bond. O agente 007, tem licença de sua Majestade, a Rainha, para matar e torturar em prol do bem estar de seus súditos britânicos.
Acontece que não é só a rainha da Inglaterra que tem o privilégio (?) de ter alguém disposto a matar e morrer pelo seu país e em favor do bem estar dos indivíduos que ali vivem. O presidente dos Estados Unidos também conta com a ajuda (quase sempre) incondicional, focada e muitas vezes, visceral de um agente. Bauer. Jack Bauer é o seu nome.



Na semana passada foi exibido, com apenas um dia de diferença entre EUA e Brasil, o décimo segundo e último episódio do mais novo dia infernal e caótico na vida desse cara que muitas vezes eu achei que fosse completamente maluco da cabeça, mas que no fim sempre se mostra mais são do que todos os envolvidos na trama da temporada.
Criada por Joel Surnow e Robert Cochran, 24 foi produzida para a FOX Networks e encontrou em Kiefer Sutherland seu protagonista. É interessante ressaltar que Jack Bauer foi como uma espécie de renascimento para a carreira do ator. Em sua juventude, Kiefer, que é filho do ator veterano Donald Sutherland, foi considerado uma das maiores promessas de Hollywood, mas o abuso de álcool e drogas acabou minando suas chances de alcançar o sucesso esperado pela crítica. Por muito tempo ele amargou papéis pequenos em filmes sem expressão, o que não ajudava em sua recuperação. A série entrou em sua vida como uma aposta extremamente alta para alguém que quase não via mais esperança de recomeçar. Felizmente, para ele e para nós, Kiefer apostou e viu não só sua carreira decolar, como ajudou a trazer para a televisão algo novo e ousado.
24 é classificada como uma série dramática, apesar do ritmo frenético das inúmeras cenas de ação que permeiam o seriado. Sua trama geral é focada no trabalho do agente na Counter Terrorist Unit (CTU) ou em português, Unidade Contra Terrorista (UCT), uma agência governamental ficcional, responsável pela detecção e neutralização de ameaças terroristas em solo norte-americano e/ou contra cidadãos norte-americanos. É claro que nosso herói não se restringe a essa descrição, sendo ele um verdadeiro “defensor de fracos e oprimidos”, com a diferença de que seus métodos são sempre bastante questionados por aqueles que não compartilham de sua visão de fazer o seu trabalho “custe o que custar”. A série, inclusive, já foi alvo diversas vezes de grupos de defesa dos Direitos Humanos, que sempre criticaram muito o uso da tortura por parte da personagem principal. Não creio que as críticas sejam infundadas, já que a tortura é algo absurdo e completamente condenável, entretanto, a série nunca banalizou o ato, simplesmente trouxeram para a ficção algo que é bastante comum e muito utilizado em diversas agências de inteligência e forças armadas pelo mundo afora. Ressalta-se também que Jack não sente prazer algum no ato de torturar, pelo contrário, ele o faz simplesmente porque o tem de fazer, mas não tira dali nada além do que quer ouvir.
O formato de 24 está intimamente relacionado com o nome escolhido. Cada temporada (com exceção da última exibida, 24: Live Another Day) possui 24 episódios, e cada um desses tem a tarefa de mostrar uma hora do dia de Jack Bauer. Ao final da temporada assistimos um dia completo na vida do agente da CTU. O relógio digital, sempre aparecendo na tela em momentos decisivos de cada episódio, serve tanto para situar o telespectador naquele momento quanto para dar a série o ar de “tempo real”, que é um dos grandes diferenciais do formato pensado pelos seus criadores. Além dele, a técnica de telas divididas é essencial para transmitir ao público a ideia de que várias ações relacionadas à trama central daquela temporada estão ocorrendo ao mesmo tempo.
Foram oito temporadas, entre os anos de 2001 e 2010. Em 2007 teve início uma greve de roteiristas de tevê, cinema e rádio, deixando o mundo do entretenimento de cabelos em pé por quase um ano e meio, quando teve seu fim em 2008. Para cobrir esse “hiato forçado”, os produtores da série criaram o filme Redemption, que serviu como uma espécie de ponte entre a sexta e a sétima temporada. O que era para ser um “tapa buracos” acabou rendendo inúmeras críticas positivas da mídia e dos fãs, várias indicações a prêmios, incluindo uma ao Globo de Ouro e cinco ao Emmy Awards e seu grande trunfo foi mostrar ao público o lado mais humano de Jack (mesmo que já tenhamos visto esse lado tantas vezes, porém sempre em momentos tão dolorosos para o protagonista – situações envolvendo Teri, Kim, Tony, Michele, Chloe, Bill, Curtis etc).
Jack Bauer é um especialista em contra terrorismo, mas poderia muito bem ser classificado como especialista em tragédias pessoais. Sua família se desintegra já na primeira temporada, sua filha Kim “bate cabeça” até se acertar lá pela sétima, aqueles que ele considerava como seus melhores amigos, quando não morrem mortes dolorosas (saudades Tony Almeida), acabam voltando para lhe trair (saudades Tony Almeida) e seus amores, bem, não têm melhores destinos. Só uma pessoa é uma constante na vida de Jack Bauer e essa é Chloe O’Brian, a analista de dados da CTU, presente na vida de dele desde a terceira temporada. O’Brian é a segunda personagem que mais apareceu na série, com uma contagem de 137 episódios, ficando atrás somente de Jack, que deu as caras em todos já exibidos. Chloe é, como ela bem colocou em LAD, a única amiga que resta a Jack e ela tem toda razão. Sempre disposta a ajudá-lo, infringindo leis e colocando-se em perigo muitas vezes, é ela quem tem linha direta com Bauer e praticamente coordena as ações do agente quando ele está em campo. A parceria deu tão certo que Kiefer Sutherland e Mary Lynn Rajskub dublaram suas respectivas personagens para um episódio de Os Simpsons totalmente inspirado no formato da série (pra quem quiser conferir, é o 21º episódio da 18ª temporada de Os Simpsons e recebeu o nome engraçadinho “24 minutes”). Jack e Chloe foram “simpsonizados” e ambos aparecem em uma espécie de linha cruzada com Bart e Lisa. Vale a pena conferir.


Como era de se esperar, Chloe está de volta também em 24: Live Another Day, uma “meia nona temporada”, já que ao invés de 24, essa nova cruzada de Jack possui somente 12 episódios. Dessa vez os eventos ocorrem em Londres e além de Chloe, outras duas personagens (tudo bem, você que já assistiu LAD sabe que outras caras conhecidas aparecem, mas parafraseando River Song, de Doctor Who: SPOILERS!) muito importantes na história de Jack fazem as honras: James Heller, agora presidente dos Estados Unidos, enfrentando um Mal de Alzheimer em avanço, e Audrey Raines (sim, eu me recuso a chamá-la de Audrey Boudreau), o grande amor de Jack, agora casada com o chefe de gabinete de seu pai, Mark Boudreau. É claro que 12 episódios são quase nada se comparados à experiência que nós, fãs, estamos acostumados a vivenciar com 24 horas de muita ação, drama e fôlego preso até os minutos finais de cada episódio. Contudo, a sensação de ter Jack Bauer de volta e a sensação de que podemos perder Jack Bauer de vez é absolutamente deliciosa, faz com que a gente tente ao máximo aproveitar cada segundo dessas 12 horinhas que nos foram gentilmente concedidas. Personagens novas também dão o tom para essa empreitada. Kate Morgan é a agente da CIA cheia de problemas pessoais e que, por alguns momentos, me pareceu uma versão feminina e um pouco menos intensa de Jack. Margot Al-Harazi (da linda e excelente Michelle Fairley, a Catelyn Stark de Game of Thrones) é a viúva terrorista que envolve os filhos numa trama de vingança e ódio, ao tomar o controle de drones norte-americanos repletos de mísseis. Temos ainda o estranho Adrian Cross, responsável pelo grupo hacker londrino do qual Chloe faz parte, um cara dúbio em suas atitudes, ora sendo desagradável e grosseiro com Jack, ora oferecendo ajuda ao mesmo.
12 horas foram muito pouco, como já disse, porém, depois de quatro anos sem qualquer ciência a respeito do paradeiro de Jack, esse meio dia já foi suficiente para empolgar e nos fazer, novamente, especular sobre o destino desse cara que todo mundo quer capturar, mas ninguém quer encontrar “na reta” quando a situação fica feia. Jack Bauer é assim, é o tipo de herói que não é herói. Não tem lá muitos escrúpulos quando se coloca frente ao bandido, não dá chance para o azar e calcula todos os seus movimentos. Ele é capaz de virar o mundo de cabeça pra baixo a fim de fazer valer o que acredita, e sim, ele tem princípios e valores, sendo a lealdade um dos que ele mais preza. E vocês sabiam que ele já é avô? É isso que eu adoro na personagem, toda essa ambiguidade entre o Jack violento, que tortura, que mata sem pensar e o cara que sonha em voltar a ver a filha e os netos, mas que sabe que isso não será possível, talvez nunca mais. Sua estrada não tem retorno e se alguém quer ter Jack Bauer como companhia, é bom saber que ele não pode parar, não pode esperar e não pode voltar, por e para ninguém. Sua sobrevivência depende disso e, depois de nove temporadas e um filme, eu acho que a gente também depende, já que salvar o mundo é a tarefa mais básica na vida desse sujeito, mais básica até mesmo do que respirar.
E que venha mais outro dia para ele viver!

Brigada e até mais ver

Dani

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